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Esperança na COP do desespero

Dois mil e vinte e cinco parece ser o ano errado para salvar o planeta. A crise do clima despencou da lista de prioridades dos líderes mundiais. O maior emissor histórico de gases de efeito estufa do mundo joga ativamente contra os objetivos do Acordo de Paris, enquanto põe a maior máquina de guerra da história humana para fazer execuções extrajudiciais na América Latina. O setor privado, da BP aos bancos a Bill Gates, abjura de planos de descarbonização. E a ONU vem a público admitir o que até os mármores da Assembleia Geral já sabiam: não existe mais possibilidade de limitar o aquecimento global a 1,5oC sem um overshoot de algumas décadas. 

Pior ainda, apenas 64 países de 197 entregaram suas Contribuições Nacionalmente Determinadas no prazo (estendido) dado pela ONU. E elas são altamente insuficientes: mesmo contando promessas como as da UE e da China, a lacuna entre o que os governos planejam fazer até 2035 e o que a atmosfera demanda é de 23 bilhões de toneladas de CO2 equivalente. É nesse contexto desesperador que o mundo se reúne em Belém, Brasil, a partir de segunda-feira (10) para a primeira COP latino-americana em 11 anos. Não seria melhor pular essa?

Não. É justamente a situação global tão dramática que exige uma resposta firme do sistema multilateral. O mundo não pode perder mais um ano de ação climática, sob pena de tornar inviável o corte de emissões demandado para estabilizar o aquecimento da Terra. A alternativa ao sucesso de Belém é assinarmos um pacto coletivo de suicídio no qual os primeiros a morrer serão os mais pobres, inclusive na América Latina.

A COP30 tem pelo menos três missões fundamentais a cumprir, e uma surpresa ainda possível.

A primeira missão é aprovar um pacote de adaptação climática que inclua, além dos indicadores da Meta Global de Adaptação (GGA), um pacote de financiamento com a determinação de triplicar os recursos para atividades de adaptação. Durante muito tempo esse foi o pilar “esquecido” da ação climática, por uma série de razões: adaptação é local e demanda investimentos públicos, longe do buzz financeiro que agita algumas atividades de mitigação. Não é muito sexy para o capital, que prefere instalar fazendas solares a recuperar manguezais. Mas a adaptação tornou-se incontornável, e precisa ser elevada ao mesmo patamar de importância da mitigação.

A segunda missão de Belém é financiamento. O mapa do caminho de Baku a Belém indicando como US$ 1,3 trilhão podem ser levantados anualmente até 2035 para financiar o combate à mudança do clima nos países em desenvolvimento foi entregue pelas presidências brasileira e azeri, e agora a COP precisa recepcioná-lo e dar passos práticos para executar as medidas propostas. Há países que defendem a incorporação do roadmap às negociações. A isso devem somar-se debates sobre financiamento público, também fora da agenda da COP até aqui, e sobre o alinhamento de fluxos financeiros à descarbonização – um item formal de agenda. Belém precisa encaminhar o tema do financiamento para reconquistar a confiança de vários países em desenvolvimento no processo multilateral após o fiasco de Baku no ano passado. 

A terceira missão é transição justa. Belém precisa avançar no Programa de Trabalho dos Emirados Árabes sobre Transição Justa, e a sociedade civil demanda que isso inclua a criação de um mecanismo institucional para isso – o BAM, ou Mecanismo de Ação de Belém. Será uma instância multilateral sob a Convenção para coordenar esforços globais de transição justa, evitando duplicação de esforços e disseminando boas experiências mundo afora.

Mas, para que seja justa, ela precisa antes ser transição. E aqui pode vir uma boa surpresa da COP30, que ao mesmo tempo poderá ser uma de suas grandes marcas: avançar na implementação da decisão de 2023 de eliminar gradualmente os combustíveis fósseis. 

Embora causem 70% das emissões de gases de efeito estufa, o petróleo, o gás fóssil e o carvão mineral simplesmente não estão na agenda da COP. Em Dubai o mundo concordou em fazer uma “transição justa, ordenada e equitativa para longe dos combutíveis fósseis”, mas não estabelecei critérios de justiça, ordem ou equidade, muito menos um calendário para o início dessa transição. Pior ainda, vários países tentaram meter um “foi mal, tava doidão” e retroceder na decisão de Dubai. Hoje o tema “combustíveis fósseis” é tabu na negociação e garantia de impasse. 

Só que não há nenhuma possibilidade de responder à insuficiência das NDCs sem fazer algo para implementar a decisão de Dubai. Em 2024, o Brasil afirmou em sua NDC que daria as boas-vindas a um processo internacional para estabelecer esse calendário de transição. A hora é agora. 

Ninguém tem a ilusão de que, no atual contexto, a COP30 possa produzir uma revolução nessa agenda. Mas um mapa do caminho que ponha essa bola para rolar e que nos dê algum resultado concreto até a COP31, no ano que vem, já seria um grande salto para a humanidade. E mostraria a Donald Trump que o resto do mundo ainda se importa com essas coisas bobas como manter a vida na Terra.

Dada a oposição de grupos poderosos de países e do lobby fóssil, e às próprias inclinações petroleiras do governo do Brasil, não será uma tarefa fácil. Mas conferências do clima são palco propício a milagres. Ainda mais quando elas acontecem num lugar com o nome de Belém.

La voz de CANLA